que para ser mais frequentado sómente lhe faltam accommodações apropriadas ao uso deste remedio: e querendo proporcionar a todos os meus vassallos os meios e auxílios precisos para se poderem utilizar do beneficio e saudaveis effeitos das mencionadas aguas ... Hei por bem aprovar o projecto offerecido pelo Governador da sobredita Ilha de Santa Catharina, da erecção de um hospital no logar daquellas aguas com as convenientes acomodações ... abrindo-se em todo este Reino uma subscripção de donativos, para cuja validade sou servido conceder a precisa licença: e para fundo e patrimonio do mesmo hospital, que ficará debaixo da minha immediata protecção, e se regulará pelos estatutos do das Caldas da Rainha no que fôr aplicável ... Palacio da Real Fazenda de Santa Cruz em 18 de Março de 1818. Com a rubrica de El-Rei Nosso Senhor.”. Configura-se assim o início da construção da 1ª estância hidrotermal do Brasil. A saber: o “Hospital Termal das Caldas da Rainha”, localizado a menos de 100 km de Lisboa, Portugal, foi fundado em 1485 pela Rainha Dona Leonor, a primeira ocupante do trono português com sangue Bragança. Esse hospital é considerado o mais antigo do mundo em funcionamento.
     A construção do hospital em Caldas da Imperatriz não teve início imediato, principalmente, em função da grande presença indígena na região. Somente 24 anos depois, em 18 de março de 1842 com a Lei nº 164, a Assembleia da Província determinou construção com recursos do Governo, doações e loterias. No ano de 1844 também são recebidos recursos do Governo, inclusive com um expressivo aporte de quatrocentos mil réis doados pela Imperatriz Dona Teresa Cristina. Nessa oportunidade ela aceitou receber o título de “Protetora do Hospital de Caldas” e permitindo que a denominação passasse a ser Caldas da Imperatriz.
     É também no 2º Reinado que se intensificam os esforços para a construção de um projeto de identidade nacional. Em 14 de setembro de 1845 após uma sessão Assembleia Geral Legislativa, Dom Pedro II anunciou o desejo de conhecer as províncias do Império, com o objetivo fazer sentir à população as duas primeiras necessidades da Nação: a ordem e a justiça. Assim, em razão de uma série de questões políticas e do final da Revolução Farroupilha, em outubro daquele ano ele e sua esposa Imperatriz Dona Teresa Cristina viajam ao sul do país em direção à província de São Pedro do Rio Grande do Sul; com visita a outras localidades incluindo Desterro e Caldas da Imperatriz: a primeira viagem oficial do casal imperial.
     Dom Pedro II e comitiva embarcam no vapor Imperatriz com uma frota composta por oito navios. Desembarcam em Desterro em 12 de outubro de 1845, onde permanecem por 18 dias. Nesse período, dentre os vários compromissos, o casal imperial conhece o Imperial Hospital de Caridade, repartições públicas, escolas, e localidades como a Lagoa, Ribeirão e Santo Antônio. No dia 29 inicia-se a viagem para Caldas: a comitiva imperial embarca para São José onde almoça na residência do Coronel Joaquim Xavier Neves, e segue viagem a cavalo na direção Sant`Anna, atual Santo Amaro da Imperatriz, onde janta. O trajeto desse percurso foi preparado especialmente para recepcionar a passagem dos imperadores, inclusive, sendo adornado com figueiras plantadas para essa ocasião. Na sequência atravessa de balsa o rio Cubatão, e continua viagem até Caldas da Imperatriz onde chega por volta das 19 horas. Os imperadores foram recepcionados com uma ceia e ficaram hospedados no prédio principal (no aposento que atualmente corresponde ao quarto nº 33 do Hotel Caldas da Imperatriz). No dia seguinte o casal visitou as obras e imediações do hospital e se mostrou satisfeito com o que viu. Dom Pedro II se ocupou por algum tempo com algumas observações termométricas em diversas nascentes, bem como, com conversas a esse respeito. Nessa época não haviam ainda sido instaladas as banheiras. Dentre as iguarias oferecidas à Corte durante a estadia foram servidos alimentos naturais que melhor representavam o gosto e a produção da região, com receitas tradicionais da época e que persistem até os dias de hoje. Às 8 horas do dia 31 a comitiva imperial deixa o hospital e continua sua viagem em direção ao Rio Grande do Sul. Essa visita às instalações de Caldas da Imperatriz aconteceu depois de mais de 27 anos desde que Dom João VI, avô de Dom Pedro II, assinou o Decreto aprovando a criação do hospital. É de se ressaltar também que para todos os eventos e visitas à Província grande aparato receptivo foi preparado, e que em todos eles o casal imperial foi saudado efusivamente pelo povo.
     Durante anos o hospital funcionou alternando períodos estáveis e de declínio, sendo que, por volta de 1920 passou por uma grande reforma e foi transformado em hotel. De maneira geral, manteve as linhas arquitetônicas originais e, em perfeito funcionamento, as antigas banheiras de mármore de Carrara trazidas da Itália doadas pela Imperatriz Teresa Cristina. Atualmente a edificação está estabelecida como Hotel Caldas da Imperatriz, ficando aberta ao público e turistas durante todo o ano; pertence à empresa Hidro Caldas - Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz, que administrativamente está vinculada à Prefeitura Municipal da cidade de Santo Amaro da Imperatriz. Está localizada na mesorregião da Grande Florianópolis e a aproximadamente 30 km de distância do Oceano Atlântico. Está situada dentro do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, sendo coberta por Mata Atlântica preservada, e faz parte da cadeia montanhosa meridional da Serra do Mar. Suas águas termais apresentam uma temperatura constante de 39,8°C (equivalente a 32° Réaumur), contêm a presença de rádio, são incolores e isentas de sabor ou odor, e possuem qualidades reconhecidas mundialmente.
     A esse respeito, no vídeo a seguir Juliano Souza da Silva, advogado e pesquisador, relata alguns dos fatos históricos que marcaram a história de Caldas da Imperatriz.


     Raramente a natureza reúne as formações geomorfológicas necessárias para propiciar o aparecimento das águas termais: as águas quentes que emergem das profundezas da terra com qualidades únicas. Sob um ponto de vista geral as fontes termais se constituem no resultado de águas que transpõem as camadas Terra, atravessam longos e imprecisos caminhos até a superfície trazendo consigo propriedades físico-químicas dadas pelas regiões onde são geradas, e diferenciadas pelos elementos que as compõem: compostos orgânicos e inorgânicos, dentre os quais, não-metais como o enxofre, e até mesmo metais radioativos com maior ou menor meia-vida, a exemplo do rádio, um alcalino-terroso, e do tório e do actínio do grupo das terras raras.
     Há que se considerar que as particularidades adquiridas provêm de condições específicas que sempre suscitam pesquisas, mas que de forma genérica perfazem um ciclo que pode durar centenas de anos: 1) por gravidade as águas oriundas da atmosfera são conduzidas a lençóis freáticos através de infiltrações resultantes de falhas geológicas; 2) são aquecidas a elevadas temperaturas pelo contato com fontes de calor geotérmicas, magmas em estado de fusão situados a grandes profundidades; 3) retornam sob forte pressão através de túneis espontaneamente esculpidos pela natureza que asseguram a sua condução até a superfície; 4) alcançam a superfície aquecidas e com novas propriedades, e no contato com a atmosfera liberam uma extensa gama de elementos químicos, frutos dos processos ocorridos no interior da terra. As características físicas da região onde ocorre esse ciclo é que vão determinar a identidade da água de cada fonte.
     Em 18 de março de 2018 se comemora 200 anos desde a assinatura do Decreto de Dom João VI aprovando a criação do hospital de Caldas da Imperatriz, e mais de 172 anos desde a visita do casal imperial Dona Teresa Cristina e Dom Pedro II às suas instalações. Muitos são os fatos que marcaram a história dessas águas termais: desde as lutas pela posse da terra e das fontes, até os incontáveis benefícios oferecidos aos que ali recorreram. Gerações e gerações se passaram desde então, e as fontes continuam lá incólumes provendo águas da melhor qualidade, imaculadas em sua missão de amenizar dores humanas; dores que afligem seus corpos, suas mentes e seus espíritos, e que incontinênti, trazem alento aos necessitados.
     A histórica construção foi reformada e ampliada. Hoje como um Hotel Termal, ainda retém no presente traços de um tempo que também permanece inalterado: guarda na alvenaria, nas linhas arquitetônicas, nas pedras, nas escadas, nas paredes e pisos, nas salas e quartos, nas janelas e portas, e nas antigas banheiras de mármore, muito da potência que se comprometeu em oferecer. Num ambiente de ar puro rodeado de plantas e matas nativas dispostas por entre as onduladas montanhas da Serra do Tabuleiro, e de águas límpidas que descendem sobre as pedras do contíguo ribeirão das Águas Claras, e ainda, das inúmeras espécies de pássaros e animais silvestres que ali habitam, forma um cenário de sons e silêncios que descrevem sentimentos: genuínos sentimentos de esperanças creditados às suas curativas águas; sentimentos pretéritos e futuros que hão de ressoar por todo o sempre como uma memória viva daqueles que suas vidas a elas confiaram.

     É sobre essa perspectiva que esse projeto fotográfico foi desenhado. Realizado durante o ano de 2017 e início de 2018, teve como cenário o ambiente que envolve a história das águas termais e das instalações do antigo hospital; um lugar com uma energia incomum, que também faz parte da minha vida há quase trinta anos. São muitas as lembranças pessoais que tenho desde a infância dos meus filhos, quando em algumas manhãs de sábados saíamos de Florianópolis em direção a Caldas para tomarmos banhos nas banheiras de águas termais, e provarmos a deliciosa gastronomia local. Fatos que marcam a vida da minha família e motivos que muito contribuíram para a realização deste trabalho, no entanto, foram também desafiadores de certa forma. Isto porque um olhar mais abrangente houve de ser desenvolvido: um olhar que captasse a atmosfera e os sentimentos que percebo materializado por todos os lugares; com certeza um exercício de grande realização. Além disto, o trabalho foi enriquecido com imagens concedidas pelo amigo Juliano Souza da Silva: de jornais e de fotografias históricas, que são parte de suas pesquisas sobre a história do Hotel Caldas da Imperatriz, bem como, da viagem que realizou às instalações do Hospital Termal Rainha Dona Leonor em Portugal em maio/2017.
     Caldas da Imperatriz é uma herança viva da nossa história... da história de Santa Catarina e do Brasil! Uma joia que orgulha os santo-amarenses: povo laborioso que incansavelmente tem se dedicado em preservar esse magnífico patrimônio termal; povo a quem eu tenho a honra de dedicar essa exposição fotográfica em comemoração aos seus 200 anos!